Carta de Goiânia – Associação Brasileira de Saúde Coletiva
Nós, pesquisadores, docentes, estudantes, profissionais e militantes da Saúde Coletiva, reunidos em Goiânia (GO) de 28 de julho a 1º de agosto de 2015, durante 11º Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva reafirmamos nossos compromissos com a democracia, o desenvolvimento e o desafio do SUS universal.
A década anterior, de melhoria das condições de vida de milhões de brasileiras e brasileiros, nos incitava a apontar os limites e a querer mais: desenvolvimento sustentável, superação das desigualdades históricas, soberania nacional, democracia participativa e políticas universalistas.
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No entanto, após as eleições de 2014, o governo, diante das pressões do mercado financeiro e da mídia comercial, ao invés dos ajustes necessários para a continuidade do crescimento e da redução das disparidades sociais, promoveu uma reorientação radical da política econômica, provocando recessão, desemprego e diminuição de investimentos nas políticas sociais. Tal orientação econômica levou ao enfraquecimento da coalização governista e abriu espaço para facções conservadoras que não se intimidam em destilar sua aversão às instituições democráticas.
Na saúde, em que tantas conquistas têm sido alcançadas nos 27 anos de SUS, o período recente tem sido marcado por retrocessos: a derrota do Projeto de Lei de Iniciativa Popular que estabelecia o piso de 10% das Receitas Correntes Brutas da União para a saúde, a constitucionalização do subfinanciamento com a Emenda Constitucional 86, aliadas ao reforço da mercantilização e da financeirização da prestação de serviços de saúde com a legalização da abertura de capital estrangeiro, além da proposta de emenda à Constituição (PEC 87/2015) que prorroga a Desvinculação de Receitas da União (DRU) até 2023 e amplia de 20% para 30% o percentual das receitas de tributos federais que podem ser usadas livremente. Ressalta-se ainda a drenagem de recursos para o pagamento de uma dívida pública jamais auditada.
O Brasil está, portanto, diante de ameaças concretas à saúde da população, aos profissionais de saúde e à sustentabilidade da proteção social garantida pelo Sistema Único de Saúde (SUS) desde sua criação em 1988.
Apesar das inúmeras evidências demostrando que o sistema que defendemos , solidário e universal, é mais eficiente que o mercantil privado, assiste-se uma reorganização das políticas e práticas em benefício de interesses econômicos particulares.
O acirramento da privatização do SUS estende-se à gestão dos serviços e das estruturas públicas, ao crescimento dos gastos privados e aos incentivos para expansão do mercado de planos e seguros de saúde.
Ao diminuir os recursos, manter o subfinanciamento e reduzir a oferta pública encoraja-se o privado a ocupar o lugar que o público deve preservar para garantir o direito à saúde.
A privatização do SUS, além de aumentar os gastos totais com saúde para a sociedade, constitui um recuo para a qualidade e o acesso, acirra a fragmentação e a exclusão, aumenta as desigualdades, a individualização das demandas e o consumismo de cuidados médicos.
A privatização, ao abalar a sustentabilidade financeira do SUS, corrói os valores de igualdade , de justiça, de solidariedade que nossa sociedade levou tempo para integrar nas suas instituições e que tem na saúde o maior exemplo de inspiração para políticas e programas universais.
Delineia-se um cenário no qual o SUS se restringirá, cada vez mais, a um sistema de atenção básica para os pobres e de resseguro, no caso dos procedimentos de alto custo, para os planos e seguros de saúde privados.
Enquanto campo científico e técnico, a Saúde Coletiva cresceu e se fortaleceu desde sua fundação na segunda metade da década de 1970. Temos produzido conhecimento, formado profissionais e acumulado experiências, sempre com espírito crítico e compromisso social.
Mas o campo também encontra-se sob o risco de retrocessos, a exemplo da precária sustentabilidade dos cursos de graduação em Saúde Coletiva. Criados para atender a expansão dos serviços públicos de saúde, experimentam hoje os impasses de uma conjuntura marcada pela escassez de concursos para sanitaristas, na contramão da necessidade de profissionalização da gestão da saúde.
Aos militantes da Reforma Sanitária, cabe se unir à luta do povo pelos seus direitos. Compete a nós compartilhar com os movimentos populares, democráticos, nacionalistas e socialistas um projeto de desenvolvimento soberano, sustentável e inclusivo.
A 15ª CNS, precedida de suas etapas municipais e estaduais, é o espaço privilegiado para a mobilização e o envolvimento da sociedade nesse debate.
Devemos exigir a mudança de orientação da política econômica do governo federal, recusando as políticas de ajuste que comprometem as condições de vida e a saúde dos trabalhadores e da população brasileira. Também com veemência, nos manifestamos em defesa da legalidade democrática, contra qualquer ameaça à ordem constitucional.
Urge barrar os ataques ao SUS , à universalidade e à igualdade da atenção em saúde; resistir à lógica privatista e reafirmar o direito à saúde como dever do Estado; exigir a extinção da DRU, a recomposição do orçamento do Ministério da Saúde, o fim dos subsídios públicos aos planos privados, a fixação de profissionais de saúde em todas as regiões do país e o investimento tripartite na consolidação das redes regionais de saúde.
O documento orientador da 15ª CNS oferece um roteiro de discussões, que pode ser traduzido em orientações para a mobilização popular em prol da saúde e qualidade de vida de todos.
Por fim, os pesquisadores e trabalhadores da Saúde Coletiva, colocam à disposição da sociedade seus melhores esforços de reflexão, conhecimento e militância.Não permitiremos o desmonte do SUS e a falência da democracia! Que não ousem tocar no direito à saúde!
Nós resistiremos!
Cerimônia de encerramento aprova Carta de Goiânia e várias Moções
Sessão presidida pelos dois presidentes da Abrasco anunciou ainda os ganhadores do prêmio Eleutério Rodrigues e pré-aprovou a próxima edição
Representar a qualidade científica e política de um evento de seis dias não é uma tarefa fácil, mas a mesa de encerramento do 11º Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva, o Abrascão 2015, conseguiu este feito com brilhantismo, alegria e sobriedade na cerimônia realizada no último dia, em 1º de Agosto no Centro de Cultura e Eventos da Universidade Federal de Goiás (UFG).
A mesa, composta pelos dois presidentes da Abrasco, Luis Eugenio e Gastão Wagner, pelo presidente do Congresso, Elias Rassi Neto, pelos secretários-executivos titular e adjunto, Carlos Silva e Thiago Barreto, respectivamente, contou ainda com a participação de Odorico Monteiro, sanitarista e deputado federal pelo Estado do Ceará.
Carlos Silva iniciou o trabalho apresentando os números de balanço do Congresso. O Abrascão 2015 credenciou 4.500 congressistas de todas as unidades federativas do Brasil, entre autores de resumos, ouvintes, conferencistas, palestrantes, convidados e expositores. As maiores presenças, por delegações, foram dos estados do Goiás (880), Rio de Janeiro (691) e São Paulo (513). Contribuíram com mais de 300 congressistas Minas Gerais, Bahia e Ceará, além do Distrito Federal.
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Houve ainda a participação de estrangeiros, a maioria convidados para exporem pesquisas e cenários da Saúde global: foram oito norte-americanos, quatro portugueses, dois colombianos e representantes individuais do México, Argentina, Cuba, Canadá, Bélgica, Etiópia e Palestina.
O quadro da produção acadêmica também salta aos olhos. Ao todo, foram 253 sessões de Comunicação Oral Curta e 226 sessões de Comunicação Oral, que reuniram 3.509 congressistas que apresentaram trabalhos. As sessões científicas, entre mesas-redondas e palestras, totalizaram 118 atividades. O Abrascão 2015 teve ainda quatro grandes debates e das inúmeras atividades das tendas Oraida Abreu e Abrasco Jovem, além dos cursos, das oficinas e das reuniões de Grupos Temáticos e Comissões da Abrasco e de outras organizações parceiras, realizadas no período pré-congressual e tão responsáveis quanto pelo brilho do evento. “Foi um grande congresso. Muito obrigado a todos que participaram”, agradeceu Carlos Silva.
Thiago Barreto conduziu a apresentação do Prêmio Eleutério Rodrigues, instituído neste Abrascão como forma de reconhecer os trabalhos de maior destaque apresentados nas sessões de comunicação oral e comunicação oral curta do Congresso.
A seleção foi feita por um time de pareceristas selecionados dentro da Comissão Científica, conduzidos por Wildo Navegantes de Araújo, professor do Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da Universidade da Brasília (UnB)sem identificação dos autores e. Ao final, quatro trabalhos foram agraciados com o prêmio e os demais 10 receberam menção honrosa.
A premiação refletiu o espectro da Saúde Coletiva, reconhecendo pesquisadores de renome, como Lígia Bahia, Mario Scheffer e Carlos Coimbra, assim como jovens promessas da área acadêmica, como Daniela Silva Canella e Maria Concebida da Cunha Garcia. Confira a relação completa na matéria especial.
Após a premiação, Luis Eugenio anunciou a indicação da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) para a realização da 12ª edição do Abrascão, na cidade de Porto Seguro, que contará com o apoio da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). A indicação foi pré-aprovada, a ser chancelada em definitivo pela Secretaria Executiva da Abrasco após o levantamento de viabilidade.
Carta de Goiânia: Na sequência, Elias Rassi Neto, presidente do Congresso, leu a nota oficial do Abrascão 2015, a Carta de Goiânia. O documento parte da análise da mudança de postura do governo federal que, a partir das eleições de 2014, “promoveu uma reorientação radical da política econômica, provocando recessão, desemprego e diminuição de investimentos nas políticas sociais”.
O documento comprova que o SUS está ameaçado em sua proposta republicana devido a uma política econômica que esvazia os investimentos públicos na área. “Na saúde, em que tantas conquistas têm sido alcançadas nos 27 anos de SUS, o período recente tem sido marcado por retrocessos: a derrota do Projeto de Lei de Iniciativa Popular que estabelecia o piso de 10% das Receitas Correntes Brutas da União para a saúde, a constitucionalização do subfinanciamento com a Emenda Constitucional 86, aliadas ao reforço da mercantilização e da financeirização da prestação de serviços de saúde com a legalização da abertura de capital estrangeiro, além da proposta de emenda à Constituição (PEC 87/2015) que prorroga a Desvinculação de Receitas da União (DRU) até 2023 e amplia de 20% para 30% o percentual das receitas de tributos federais que podem ser usadas livremente.”
Como proposta de ação individual e coletiva, a Carta convoca a todos a lutar por uma gestão governamental em prol da ampliação das políticas públicas sociais e que se paute pela defesa intransigente da universalidade e da qualidade do sistema nacional de saúde. “Devemos exigir a mudança de orientação da política econômica do governo federal, recusando as políticas de ajuste que comprometem as condições de vida e a saúde dos trabalhadores e da população brasileira. Também com veemência, nos manifestamos em defesa da legalidade democrática, contra qualquer ameaça à ordem constitucional”
“Urge barrar os ataques ao SUS, à universalidade e à igualdade da atenção em saúde; resistir à lógica privatista e reafirmar o direito à saúde como dever do Estado; exigir a extinção da DRU, a recomposição do orçamento do Ministério da Saúde, o fim dos subsídios públicos aos planos privados, a fixação de profissionais de saúde em todas as regiões do país e o investimento tripartite na consolidação das redes regionais de saúde.”
Outras moções: Encerrada a leitura seguida por palmas e palavras de apoio, a Carta de Goiânia foi aclamada por unanimidade pela plenária final, que passou para a apreciação das demais moções, lidas por Gastão Wagner.
Ao total, foram nove as moções aprovadas. Confira a lista de documentos ao final da matéria. Rassi e Gastão Wagner fizeram considerações finais. “Nossas atividades tiveram envolvimento de diversos professores e colegas, tanto em nível local como nacional, coordenados pelas estruturas da Abrasco e Comissão Local, e isso se iniciou numa oficina há dois anos, realizada em Pirenópolis. O fato de todo esse processo ter se dado em conjunto com a Conferência Nacional de Saúde fez com que trabalhássemos com prazos encurtados. A expectativa era que a 15ª CNS fosse também antecipada, mas me parece que a nossa escolha para a realização do Abrascão neste final de julho, início de agosto vai ter um peso importante para as etapas municipais e estaduais”, disse ele, destacando também a importância do evento para o campus Samambaia, bem como para toda UFG; a valorização dos trabalhos apresentados, com o fim dos pôsteres e a criação do prêmio; o trabalho da comissão local de cultura, e da equipe da Abrasco.
Gastão agradeceu ao presidente Luis Eugenio e toda a diretoria que encerrou o mandato pela dedicação, fortalecimento e legitimação da Abrasco no cenário nacional e internacional, e pela qualidade do Congresso. “Tivemos um Abrascão plural, com muito sol, pamonha e empadão, e com forte presença dos associados, que deram apoio a nossa chapa. Agora somos 22 representantes, com 11 na composição da diretoria e 11 no Conselho, um crescimento só possível com a mudança do Estatuto. Desejo a todos nós que lutemos e vençamos, mas que a gente aproveite o caminho enquanto estivermos lutando. Até nossos próximos encontros”.
Confira o documento na íntegra
Carta de Goiânia
Lista de moções aprovadas no 11º Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva – Abrascão 2015 (clique e acesse os documentos)
Carta do Fórum de Coordenadores de PPGs em Saúde Coletiva à presidenta Dilma Roussef
Carta de recomendações do Grupo Temático Educação Popular e Saúde (GTEPS/Abrasco)
Moção do Grupo Temático Saúde Indígena (GTSI/Abrasco)
Moção do Centro Brasileiro de Estudos da Saúde (CEBES)
Moção de repúdio à postura neocolonialista e imperialista do Sr. Jeffrey Beal em relação ao Brasil e à SciELO
Moção de Apoio à greve das IFES
Moção de Apoio à Rede Interagencial de Informações para a Saúde – RIPSA
Moção de Defesa do INCA
Moção de Apoio à realização da 3ª Conferência de CT&I em Saúde
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